terça-feira, setembro 02, 2008

Autor completo, sem escrever uma linha dos roteiros


Autor completo, sem escrever uma linha dos roteiros
Luiz Carlos Merten

Na abertura de seu verbete sobre Alain Resnais no Dicionário de Cinema, Jean Tulard lembra que foi grande o debate quando o diretor de curtas estreou no longa. Em pleno surto de cinema de autor da nouvelle vague, surgia esse cineasta que se recusava a escrever os próprios roteiros. Os críticos perguntavam-se se Resnais seria mesmo um autor ou um ilustrador dos roteiros de Marguerite Duras, Alain Robbe-Grillet, Alain Cayrol, Jorge Semprun, David Mercer.

É notório que Resnais não escreve uma linha do roteiro de seus filmes e, pelo contrário, estimula seus roteiristas a irem ao limite. Quando ele começa a obra da leitura, a que se refere Bachelard, a página morta do roteiro ganha vida por obra e arte de sua mise-en-scène e a despeito das personalidades diversas de todos os escritores com quem ele trabalha, é óbvio que existe uma autoria no cinema de Resnais, e ela é só dele.

Duras (Hiroshima), Robbe-Grillet (Marienbad), Semprun (A Guerra Acabou), Mercer (Providence). Depois vieram Henri Laborit (Meu Tio da América)e Alan Ayckbourne, o dramaturgo inglês por quem Resnais ficou aficionado, adaptando primeiro Smoking/No Smoking e, agora, Medos Privados em Lugares Públicos, cujo título original é Coeurs, Corações. Um filme sobre o afeto, contra a indiferença.

De todas as colaborações de Resnais com roteiristas, a mais polêmica foi com o cartunista norte-americano Jules Feiffer, que escreveu para ele Quero Ir para Casa. Durante muito tempo, Resnais sonhou com uma versão de Mandrake, personagem rico e complexo que lhe permitiria falar de ilusionismo (e tempo). Sua única incursão pelo universo dos quadrinhos, com Feiffer, talvez seja seu filme mais decepcionante.

FONTE: Estadão - São Paulo,SP,Brazil

Nenhum comentário:

Postar um comentário