quinta-feira, agosto 21, 2008

Agosto do Poeta


21/08/2008 às 00:00:00 - Atualizado em 20/08/2008 às 20:31:44
Agosto do Poeta
Para comemorar os 64 anos de Paulo Leminski, temos dois encontros marcados com o poeta. Sexta-feira, na Livrarias Curitiba (Palladium), o biógrafo Toninho Vaz conta Leminski, enquanto Michele Pucci canta. Domingo, no Original Beto Batata, o dia 29 de agosto de 1944 será memorado com felicidade pelo catatau de amigos do polaco.

Das memoráveis lembranças de Paulo Leminski, guardo uma entrevista realizada em outubro de 1982 para o suplemento Fim de Semana, deste O Estado do Paraná. Foi no restaurante Hummel-Hummel, no Largo da Ordem. Em torno do poeta, os editores Aramis Millarch, Maí Nascimento e este colunista, mais o convidado e amigo especial Manoel Carlos Karam. Ingborg Rüst, a proprietária daquele inesquecível reduto germânico, nos assessorou com o cardápio e a adega da casa.

Longa noite, longa e rara entrevista. Nas quatro páginas em corpo 9 (mais algumas laudas de excesso), Paulo Leminski nos concedeu um raro resumo do intelectual “engajado no difícil” (pela primeira vez assim se definiu) e nos relatou (num só fôlego e sem nenhum parágrafo) a saborosa história de um polêmico encontro com artistas de vanguarda realizado em São Paulo, promovido pela revista IstoÉ.

O polaco não era fácil, como veremos a seguir.

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Paulo Leminski - Cheguei lá imbuído dos melhores propósitos, preparado, embalado com mísseis balísticos intercontinentais, Exocet, pô, de São Paulo para o Rio há aquele prestígio que eu conheço. Bom, chego lá, numa mesa tem uma starlet da Globo, mais aquele cara que fez “Jânio Quadros em 24 quadros”. E uma guria, que parecia mais uma modelo de revistinha de sacanagem, e um garotinho bonitinho que sempre estava mexendo com as mãos. Bom, e o Arrigo Barnabé, amigo meu, e já sentei ao seu lado. Curitiba e Londrina, Jaime Lerner e José Richa, sabe como é. Já fizemos aquela comunidade de cotovelo ali, né? Estávamos lá para discutir os caminhos da nova arte brasileira nos anos 80s em direção ao ano 2000. Isso é barra pesada, sabe como é? Aí começou um festival de besteira que não dava mais. Aí uma daquelas starlets começa: “Minha opinião é a seguinte: sabe, eu comecei como modelo fotográfica e daí fui convidada para trabalhar numa novela das 6. Porque, sabem, existe um certo preconceito quanto ao consumo, mas eu acho...”. Pô, eu comecei a me putear. Não saí de Curitiba, viajando de avião, que é negócio que já deixa nervoso, e chegando a São Paulo para ouvir uma bobagem dessas, uma idiota dessas! Passou-se para o outro e seguiu-se a bobajada, tinha-se que aguentar 30 minutos de besteiras... Bom, perdi a paciência! Levantei, bati a mão na mesa e fui buscar mais uma birita lá no balcão. Era no salão do Othon Hotel, tinha estenografia, gravação, o diabo! Todo um grande aparato. Eu, como bom mafioso, não iria sozinho. Tinha uns cinco da minha patota. O Régis (Bonvicino), uns outros caras que também estavam tumultuando no durante, e que também eram amigos do Arrigo. Então ficou uma cunha, uma espécie de célula cancerosa destruindo. A guria uma hora me puxou num canto e disse: “Isso aqui não é um happening. Estou aqui trabalhando e você acabando com o meu trabalho”. Disse: “Tá bom, vou voltar!”. Mas ela me deixou as marcas da unha na mão. Foram quatro horas de gravação e estenografia! Nunca fui tão estenografado em toda a minha vida! Quiseram acabar comigo. É como diz o Mick Jaeger: “O que interessa o que dizem de mim na página 46, se estou na capa?”. Eu fiz uma intervenção, tive uma performance, coisa inclusive banal em qualquer Bienal hoje. Mas daí a guria pensou que eu iria ficar que nem um professor da USP, da PUC: “Não, sim, sob o ponto de vista cultural...”. Pô, posso até fazer isso se estiver bem careta, mas se estou muito louco faço outra coisa. E assumo essas duas coisas. É como captar rádio. Uma hora me levantei e disse que qualquer bar de Curitiba, numa sexta-feira, às 9 da noite, tinha nível mais alto que aquela mesa.

FONTE: Paraná-Online (Assinatura) - Curitiba,PR,Brazil

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