terça-feira, março 18, 2008

EnvelheSer – um texto inacabado - Sandra Silva

Paduroiu Claudiu
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Sandra Silva
EnvelheSer – um texto inacabado

Envelhecer...
Não... Não quero a velhice que necessita cerzir o passado na tentativa de vestir o presente. Tampouco quero o arrefecimento das marcas sob o jugo da alienação dos dias vividos. Maus...Bons... foram meus amanheceres de sol e entardeceres de chuvas contínuos. Se a noite caiu – e tantas caíram!!! - foi porque o trigo, que faz o pão, precisava ser transformado em pão-alimento para cada mesa ao café da manhã. E, ainda assim é.
Não! Não quero o envelhecer que não transcenda o aço frio do espelho. Ele congela uma imagem distorcida, embaçada e triste, fazendo cativo o que de mais belo eu tenho: minhas asas. E, ainda quero planar sobre as calmas águas dos rios, nos quais já lavei minh’alma ,e cada vez que as toco, é certamente feito a sensação primeira.
Assim, anseio por um envelhecer profuso: de lastros constituídos e a constituir tantos mais...
Que a morte se exaure ao vir me buscar e, encontrando-me aos risos nesse labirinto que é VIDA, estenda-me a mão a implorar compaixão.
Envelhecer.... Como não?!
Envelhecer é ousar fazer um striptease pro mundo, sem medo da “feiúra” do corpo ou da nueza do espírito. É tirar a roupa como noivo em lua de mel que, embora com toda a avidez ao deleite, precisa ter calma, aprendendo sobre cada delicadeza madre-perolada.
É... Certamente envelhecer é um banquete de orgias gregas – ou bem se bebe a Baco... ou bem se brinda à Filosofia!
Saber ou não saber – eis a questão! Na velhice, não se saberá tudo nunca, bem como já se saberá o bastante para saber que não saber é que é a Sabedoria Maior.
Ao sentar-se na tal cadeira de balanço com o livro à mão, é dar ao vento permissão para brincar com as páginas que irão e voltarão, irão e voltarão... Essa é a verdadeira leitura - interpretação vívida de cada linha traçada no branco, na pele, no outro.
Quero envelhecer!!! ...
Quero ser avó dos filhos do meu filho. Quero ensinar à cada um, o que não ensinei ao pai deles; bem como quero desaprender com eles todas as tolices que lhe ensinei por ter aprendido com qualquer um.
Quero falar-lhes de Pessoa, Platão, Quintana , Djavan, pessoas...
Quero oferecer-lhes todas as rosas – as que não falam e a que fala em nome de Eco.
Quero levá-los aos tablados em noites de verão e levantar todas as cortinas para que aplaudam (ou vaiem!) Hamlet, Lear... Macbeth.
E, na pausa do batuque do samba de Paulinho, na vila, quero que ouçam a ária bachiana poetizada na 4ª. Corda de Sol.
Quero mostrar-lhes caminhos para que tentem responder se eram os deuses astronautas ou não e, na dúvida, que naveguem “por mares nunca dantes navegados”.
Quero correr com eles na praia, e poder ensinar-lhes que o tesouro do mar não se esconde em ostras recheadas de pérolas negras. Há bem mais em contar conchinhas abertas e, sobretudo, vazias na areia...
Envelhecer...
Aqui, escrevendo tudo isso... só posso sentir o sabor imensurável disso tudo; assim, como não sentir o pulsar forte, latente, estrondoso de um marcapasso natural, colocado pela VIDA, no primeiro instante do encontro genético, só corroborando a certeza que é o tempo, apenas e, tão somente!, uma doce e lúdica ilusão linear, na qual se pode contar 1, 2, 3... ou escrever-se a própria história, numa sintaxe fora dos ditames da gramática, sob a certeza (ou não) da compreensão de cada texto escrito-vivido, na consciente escolha, de reescrevê-los ao envelheSER.

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