quarta-feira, setembro 26, 2007

Apocalipse - Carlos Carvalho Cavalheiro

Carlos Carvalho Cavalheiro
Apocalipse
(06/05/2003)

Então, eu vi o caos abocanhando o tempo.
E de suas presas exalava o fétido odor de nossos corpos
putrefatos, em deterioração, em estado de decomposição,
decompondo a música que embalou o berço de Adão.
E de inopino, surgiu dos mares a corrupção.
E com sua mão direita deitava ao solo as sementes
da discórdia e da ignorância, da miséria e da estupidez.
Sem que qualquer lição nos fosse profícua, em vão
os pregadores gastavam suas gargantas em praças públicas.
Antes o apelo de Castro Alves: a praça é do povo!
Pelos intricados labirintos urbanos revestidos
do negro manto asfáltico eu vi, recuados aos muros,
os corpos esparramados e as mãos a implorar a esmola.
Meu Deus! Não deste nem a Dante e nem a Kafka
tão tétrica e esdrúxula imaginação e a mim, que nem nome
tenho de meu, senão emprestado, a mim escolheste de profeta
gago e tímido, para denunciar tamanha imoralidade?
Se detrás dos ternos e paletós importados e alinhados
escondem-se a dissimulação e a hipocrisia, a intolerância...
Em quem confiar? Asmodeu era mais previsível.
Este discurso não é pretensioso. Não se quer mudar nada.
Apenas é o anúncio. É a voz do arauto ecoando no vale:
O amanhã será construído de forma diferente,
ou não haverá sol para iluminar o céu de amanhã.

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