quinta-feira, janeiro 31, 2008




Adriano Moreira, um dos protagonistas da polémica e primeira conferência em Portugal que subscreveu a petição de apoio a Cabo Verde na União Europeia, é uma pessoa que se respeita, independentemente de eventuais controvérsias sobre o que diz ou escreve, um professor catedrático de vasto e rico currículum, um Homem de saber.
Por: Otília Leitão

Na apresentação do seu novo livro “A Comunidade Internacional em Mudança” disse ser um “teorizador reluctante” porque aprendeu, há muito tempo, a ter sempre incertezas e, por isso, formula mais hipóteses e gosta do conceito “talvez”: "Aprendi a prospectivar e a formular três hipóteses e à cautela a possibilidade de uma quarta”.
O antigo ministro do Ultramar no regime colonial e criador do mestrado em “Estratégia”, no Instituto de Ciências Sociais e Políticas, fez questão de apresentar o seu livro no Instituto de Defesa Nacional porque, referiu, foi pioneiro na Europa e foi aqui que ouviu o primeiro escritor internacional que soube entrelaçar os saberes militares com a sociedade civil, conhecimentos que considera “fazem falta à multiculturalidade”. Foi também ali que tive o privilégio, como várias individualidades cabo-verdianas o fizeram, de integrar o seu curso e aprender e desmistificar que “defesa” não é apenas de guerras, nem só para os militares, mas envolve todas as actividades de um país e todos nós.
Perante uma audiência de professores, diplomatas e altos militares, entre os quais muitos seus alunos, Armando Marques Guedes, presidente do Instituto diplomático e apresentador do livro, opinou que esta obra que enforma escritos de há vários anos, constitui “uma profecia”. Alguns autores consideram a abordagem de acordo com um tipo de racionalismo herdeira da escola clássica de Direito Natural e que partilha os seus pressupostos com a escola inglesa de Relações Internacionais, de Matin Wight e Hedley Bull, e o idealismo céptico de Raymond Aron.
Adriano Moreira explicou que este seu livro é uma reedição actualizada do que escreveu há 30 anos e confidenciou que o conceito “talvez” cuja invenção reivindica e considera de “muito fecundo”, ganhou força a partir do momento em que o seu amigo Gilberto Freire recorria a todas as formas de arte para se exprimir e dizia: “isto é poesia ou quase poesia...isto é política ou quase política”, e lhe observara que ele (Gilberto Freire) utilizava o conceito do talvez.
No “Comunidade Internacional em Mudança” fala de uma Europa dos fins do século XIX, designada “Euromundo”, e da Europa do início do século XXI, presa de incertezas e exposta a riscos “cujo controlo lhe foge mais e mais”. Aborda “as novas conjunturas” e a complexidade crescente da vida internacional. Analisa o anticolonialismo e as sequelas colonialistas. Recorda os avanços do Islão e o Cristianismo a ficar para trás e assinala que a soberania “deixou de ser considerada um poder com expressão militar”. Num mundo que se “transformou numa aldeia”, o académico observa como principais domínios as “competições comerciais e a guerra monetária” e aponta como novos temas internacionais “o das relações entre o homem e a natureza” bem como “o desequilibrio demográfico” pois “o rebanho humano ameaça dobrar a população mundial”, nota.
Sobre o real conteúdo desta obra deixo para os curiosos de aprendizagem, mas não quero deixar de referir duas particularidades. No acto público de conhecimento desta terceira edição, terça feira, Adriano Moreira referiu que a sua formação foi originada por duas quedas: “A primeira foi quando jovem licenciado fui estudar a reforma do sistema penitenciário em África no projecto Sarmento Rodrigues, mas aprendi lá que os factos não condiziam com o Direito” e a segunda “quando fui para a ONU e vi que as nossas formações tinham défices enormes e aí tive que aprender a andar, andando”. No final, Adriano Moreira, que nasceu na aldeia de Grijó de Vale Benfeito, em 1922, observou os seus discípulos na plateia e afirmou: “nunca envelhece quem envelhece ao nosso lado”. A memorizar.
otilia.leitao@gmail.com
FONTE: A Semana online - Portugal

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